quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Uma Reflexão sobre o Pensar da Cultura

 A partir dos estudos dos textos da Antropologia contemporânea pudemos perceber uma nova forma de análise da cultura, seja do ponto de vista da autoridade etnográfica, seja da forma de como a cultura é vista e analisada a partir desses novos pensadores.
A autoridade etnográfica surge a partir do momento em que o antropólogo descreve a sua presença vivida no local, a sua experiência empírica é uma forma de prestar conta ao leitor da existência daquela realidade cultural, tornando assim o que está escrito como uma realidade quase que inquestionável dos fatos observados. É a partir de Malinowski nos “argonautas do pacífico ocidental que essa relação antropologia-etnografia torna-se algo quase que única possível de existir. Lembrando que antes a etnografia era feita por viajantes e missionários que visitavam os nativos, é a partir dessa autor que observamos uma verdadeira academicização do trabalho de campo.
É exatamente com os pensadores contemporâneos que essa autoridade vem sendo questionada por diversos motivos, seja pelo fato da ausência de debate político nos escritos, seja pela falta de presença do interlocutor, ou seja do nativo, nos textos.
Pergunta-se Clifford: “Se a etnografia produz interpretações culturais através de intensas experiências de pesquisa, como uma experiência incontrolável se transforma num relato escrito e legítimo?” (CLIFFORD, 1998, p.21).
Primeiramente precisamos entender que toda construção da realidade cultural é baseada numa díade entre nativo e pesquisador, e        que é através dessa relação dialógica que a etnografia é construída. O problema é que ela vem sendo escrita muitas vezes sem um debate político epistemológico. Se formos observar os escritos de Malinowski, em nenhum momento o mesmo cita a situação de colonização vivida pelos Trobriandeses na época da experiência empírica, fato esse essencial para entendermos a relação do antropólogo com os nativos.
Outra crítica a Antropologia Clássica é a ausência da interlocução na produção final do texto antropológico, a etnografia construída unicamente a partir da experiência do pesquisador, aniquila qualquer participação discursiva do nativo com o etnógrafo.  
James Clifford propõe, uma nova estratégia, uma nova autoridade etnográfica baseada no discurso dialógico, uma forma de dar voz ao “outro”, uma autoria plural que desafia o modo ocidental de fazer antropologia.
Outra questão importante que vamos discutir é a forma como a cultura era analisada no período clássico e como vem sendo debatida atualmente, fazendo uma ponte importante com os autores contemporâneos, em especial Hannerz e Barth. A principal crítica é como a cultura era vista, observada e analisada pelos antropólogos Funcionalistas e Estruturalistas.
Os antropólogos começaram a buscar lugares onde desafiasse a ideia de Estrutura da cultura, buscando situações desconfortáveis, principalmente em zonas fronteiriças onde a hibridez é  a principal características dessas populações. É com esse pensamento Barth descreve sua experiência com os Balineses da ilha de Bali, segundo ele, uma sociedade verdadeiramente complexa. É essa complexidade que os antropólogos contemporâneos procuram para desconstruir o que havia sido construído sobre a ideia de cultura.
Segundo Barth “O uso que costumamos fazer do termo cultura tornar-se ainda mais equivocado por incorrer na profunda imprecisão de referir-se simultaneamente a uma soma total de) padrões observáveis e às bases ideais desses padrões, abrindo as portas para a recorrente falácia de construir de maneira equivocada a descrição como explicação” (pg. 107; 1989)
A cultura passa a ser vista como um aglomerado de diversidade, a multiculturalidade presente em todas as relações sociais, não podemos analisar a cultura sem percebê-la como uma difusão tanto temporal como espacial de diversos padrões que se modificam e se recriam a partir da experiência dos indivíduos numa determinada sociedade.
A cultura então é vista como um processo que está a todo momento em constantes mudanças, daí podemos perceber o erro cometido por diversos escritores em defender o “resgate da cultura” como se a mesma fosse algo inerte, estático ao tempo, ao espaço e as relações sociais, em que ao qualquer momento pudéssemos busca-la e trazê-la para o presente. O que podemos esta observando constantemente são padrões culturais, padrões esses que se modificam e se transformam.
O problema é que fomos ensinados a procurar esses padrões em meio a uma verdadeira aculturação que são as relações sociais, segundo Barth “Em vez de tentarmos fazer com que nossas teorias dêem conta do que efetivamente encontramos, somos levados a escolher algum padrão claro e determinado em meio a esse cenário confuso e a aplicar nossa engenhosidade para salvar o holismo (funcionalista) por meio da construção de isomorfismo e inversões (estruturalistas) desse padrão escolhido ao acaso, como se ele se codificasse um encandeamento mais profundo” (pg. 109; 1989)
Hannerz analisa em Fluxos, fronteiras e híbridos a ideia dessas três palavras chaves para se entender essa nova forma de pensar a cultura. Entendo fluxo como o escoamento ou movimento contínuo de algo que segue um curso, dessa forma que o autor compreende a cultura. “Fluxo como várias outras palavras chaves examinadas nesse artigo, aponta, para uma macroantropologia, um ponto de vista bastante abrangente da coerência (relativa) e da dinâmica de entidades sociais e territoriais maiores do que aquelas convencionalmente abordadas pela disciplina” (Hannerz, 11).
Devemos perceber então por significado, uma relação entre signos e observador, e não algo concreto que simplesmente pode ser buscando e analisado monocraticamente sem a relação dialógica como havíamos dito entre pesquisador e pesquisado.
A cultura deve então ser  compreendida como esses fluxos e contrafluxos onde, diversas sociedades trocam experiências e junto com elas significados culturais, relações essas que criam e recriam cultura.

Finalizo então com Barth ao afirmar que“ a importância de tentarmos construir uma antropologia coerente, capaz de abordar esses temas e questões. Há teorias demais construídas com objetivos estreitos e limitados, sem verificar suas forças e fraquezas em outros setores do vasto empreendimento antropológico. Também não creio ser saudável ou defensável aplicar a um pequeno setor da antropologia premissas, concepções ou instrumentos de conhecimento que se mostraram sem base ou infrutíferos em outras partes do nosso campo. Nossos esforços no sentido de reconstruir, reformar, descartar e construir teorias devem ser incessantes e devem buscar abrangências e consistências.” (pg. 139)

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