A partir dos estudos dos textos da Antropologia
contemporânea pudemos perceber uma nova forma de análise da cultura, seja do
ponto de vista da autoridade etnográfica, seja da forma de como a cultura é
vista e analisada a partir desses novos pensadores.
A autoridade etnográfica
surge a partir do momento em que o antropólogo descreve a sua presença vivida no
local, a sua experiência empírica é uma forma de prestar conta ao leitor da
existência daquela realidade cultural, tornando assim o que está escrito como
uma realidade quase que inquestionável dos fatos observados. É a partir de Malinowski
nos “argonautas do pacífico ocidental que essa relação antropologia-etnografia
torna-se algo quase que única possível de existir. Lembrando que antes a
etnografia era feita por viajantes e missionários que visitavam os nativos, é a
partir dessa autor que observamos uma verdadeira academicização do trabalho de
campo.
É exatamente com os
pensadores contemporâneos que essa autoridade vem sendo questionada por
diversos motivos, seja pelo fato da ausência de debate político nos escritos,
seja pela falta de presença do interlocutor, ou seja do nativo, nos textos.
Pergunta-se Clifford: “Se a
etnografia produz interpretações culturais através de intensas experiências de
pesquisa, como uma experiência incontrolável se transforma num relato escrito e
legítimo?” (CLIFFORD, 1998, p.21).
Primeiramente precisamos
entender que toda construção da realidade cultural é baseada numa díade entre
nativo e pesquisador, e que é
através dessa relação dialógica que a etnografia é construída. O problema é que
ela vem sendo escrita muitas vezes sem um debate político epistemológico. Se
formos observar os escritos de Malinowski, em nenhum momento o mesmo cita a
situação de colonização vivida pelos Trobriandeses na época da experiência
empírica, fato esse essencial para entendermos a relação do antropólogo com os
nativos.
Outra crítica a Antropologia
Clássica é a ausência da interlocução na produção final do texto antropológico,
a etnografia construída unicamente a partir da experiência do pesquisador,
aniquila qualquer participação discursiva do nativo com o etnógrafo.
James Clifford propõe, uma
nova estratégia, uma nova autoridade etnográfica baseada no discurso dialógico,
uma forma de dar voz ao “outro”, uma autoria plural que desafia o modo
ocidental de fazer antropologia.
Outra questão importante que
vamos discutir é a forma como a cultura era analisada no período clássico e
como vem sendo debatida atualmente, fazendo uma ponte importante com os autores
contemporâneos, em especial Hannerz e Barth. A principal crítica é como a
cultura era vista, observada e analisada pelos antropólogos Funcionalistas e
Estruturalistas.
Os antropólogos começaram a
buscar lugares onde desafiasse a ideia de Estrutura da cultura, buscando
situações desconfortáveis, principalmente em zonas fronteiriças onde a hibridez
é a principal características dessas
populações. É com esse pensamento Barth descreve sua experiência com os
Balineses da ilha de Bali, segundo ele, uma sociedade verdadeiramente complexa.
É essa complexidade que os antropólogos contemporâneos procuram para
desconstruir o que havia sido construído sobre a ideia de cultura.
Segundo
Barth “O uso que costumamos fazer do termo cultura tornar-se ainda mais
equivocado por incorrer na profunda imprecisão de referir-se simultaneamente a
uma soma total de) padrões observáveis e às bases ideais desses padrões,
abrindo as portas para a recorrente falácia de construir de maneira equivocada
a descrição como explicação” (pg. 107; 1989)
A
cultura passa a ser vista como um aglomerado de diversidade, a
multiculturalidade presente em todas as relações sociais, não podemos analisar
a cultura sem percebê-la como uma difusão tanto temporal como espacial de
diversos padrões que se modificam e se recriam a partir da experiência dos
indivíduos numa determinada sociedade.
A
cultura então é vista como um processo que está a todo momento em constantes
mudanças, daí podemos perceber o erro cometido por diversos escritores em
defender o “resgate da cultura” como se a mesma fosse algo inerte, estático ao
tempo, ao espaço e as relações sociais, em que ao qualquer momento pudéssemos
busca-la e trazê-la para o presente. O que podemos esta observando
constantemente são padrões culturais, padrões esses que se modificam e se
transformam.
O
problema é que fomos ensinados a procurar esses padrões em meio a uma
verdadeira aculturação que são as relações sociais, segundo Barth “Em vez de
tentarmos fazer com que nossas teorias dêem conta do que efetivamente
encontramos, somos levados a escolher algum padrão claro e determinado em meio
a esse cenário confuso e a aplicar nossa engenhosidade para salvar o holismo
(funcionalista) por meio da construção de isomorfismo e inversões
(estruturalistas) desse padrão escolhido ao acaso, como se ele se codificasse
um encandeamento mais profundo” (pg. 109; 1989)
Hannerz
analisa em Fluxos, fronteiras e híbridos a ideia dessas três palavras chaves
para se entender essa nova forma de pensar a cultura. Entendo fluxo como o
escoamento ou movimento contínuo de algo que segue um curso, dessa forma que o
autor compreende a cultura. “Fluxo como várias outras palavras chaves
examinadas nesse artigo, aponta, para uma macroantropologia, um ponto de vista
bastante abrangente da coerência (relativa) e da dinâmica de entidades sociais
e territoriais maiores do que aquelas convencionalmente abordadas pela
disciplina” (Hannerz, 11).
Devemos
perceber então por significado, uma relação entre signos e observador, e não
algo concreto que simplesmente pode ser buscando e analisado monocraticamente
sem a relação dialógica como havíamos dito entre pesquisador e pesquisado.
A
cultura deve então ser compreendida como
esses fluxos e contrafluxos onde, diversas sociedades trocam experiências e
junto com elas significados culturais, relações essas que criam e recriam
cultura.
Finalizo
então com Barth ao afirmar que“ a importância de tentarmos construir uma
antropologia coerente, capaz de abordar esses temas e questões. Há teorias
demais construídas com objetivos estreitos e limitados, sem verificar suas
forças e fraquezas em outros setores do vasto empreendimento antropológico.
Também não creio ser saudável ou defensável aplicar a um pequeno setor da
antropologia premissas, concepções ou instrumentos de conhecimento que se
mostraram sem base ou infrutíferos em outras partes do nosso campo. Nossos
esforços no sentido de reconstruir, reformar, descartar e construir teorias
devem ser incessantes e devem buscar abrangências e consistências.” (pg. 139)
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